Candidato à reeleição, o líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), foi o maior favorecido por uma manobra do Planalto que permitiu a liberação de emendas às vésperas da eleição.
Os recursos foram desbloqueados após medidas do presidente Jair Bolsonaro (PL) que autorizaram o uso, ainda neste mês, de parte da verba do Orçamento para bases políticas de parlamentares.
Desde o início do mês, o governo garantiu a reserva de dinheiro a cerca de 600 emendas, que somam quase R$ 450 milhões.
Barros foi autor de emendas de cerca de R$ 25 milhões —R$ 5,5 milhões para as obras de um hospital em Pitanga (PR) e R$ 19,1 milhões para a construção de um centro de convenções em Maringá (PR), cidade da qual já foi prefeito.
Procurado, Barros disse que as emendas foram indicadas no início do ano e que a “execução desses recursos ocorre à medida que são liberados no Orçamento”.
Os recursos, bloqueados por falta de espaço no Orçamento, ficaram disponíveis após a edição de duas medidas provisórias que adiaram ou limitaram despesas de ciência e cultura aprovadas pelo Legislativo.
A manobra, revelada pela Folha, autorizou a transferência de R$ 5,6 bilhões em gastos para 2023 e abriu caminho para a liberação de parte das emendas, sendo R$ 3,5 bilhões em emendas de relator, distribuídas por critérios políticos e que permitem a congressistas mais influentes abastecer seus redutos eleitorais.
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Hoje existem quatro tipos de emendas: as individuais —a que todo deputado e senador têm direito—, as de bancada —em que parlamentares de cada estado definem prioridades para a região—, as de comissão — definida por integrantes dos colegiados do Congresso— e as de relator.
Aliados do governo são maioria entre os beneficiados pelas emendas liberadas pela manobra do Planalto.
Também estão na lista, entre outros, o deputado Genecias Noronha (PL-CE) e o ex-ministro Osmar Terra (MDB-RS), que concorre à reeleição como deputado federal. Barros lidera a lista com folga.
No caso da emenda enviada para Pitanga, ele se aliou ao deputado Sérgio Souza (MDB-PR), que comanda a bancada ruralista no Congresso e também é da base de Bolsonaro. Eles conseguiram a liberação de R$ 11 milhões (R$ 5,5 milhões cada um) para a continuidade da obra do hospital, paralisada desde março.
Souza visitou a cidade em maio. Na ocasião, prometeu o envio dos R$ 11 milhões para o projeto. “Todas [as emendas] foram devidamente cadastradas bem antes do período eleitoral e serão usadas pelo município para atenção básica [à saúde]”, afirmou o deputado à Folha.
Além do Paraná, o Ceará figura entre os estados que mais tiveram recursos oriundos de emendas de relator liberados às vésperas da eleição. Os prefeitos de Boa Viagem, Regis Carneiro (Solidariedade), e de Novo Oriente, Nenen Coelho (Solidariedade), conseguiram a liberação de R$ 9,5 milhões cada um.
O dinheiro será usado para obras que ainda serão contratadas. Os pedidos do estado foram feitos pelos próprios prefeitos ao Congresso, mas as emendas tiveram o apoio do deputado Genecias Noronha.
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O parlamentar desistiu de concorrer a cargo eletivo neste ano por responder a um processo na Justiça Eleitoral por abuso de poder nas eleições de 2018. Ele tenta emplacar o filho, Matheus Noronha (PL), para a vaga de deputado federal. O prefeito de Boa Viagem tem feito campanha para Matheus.
Genecias não respondeu aos questionamentos feitos pela Folha sobre a liberação das emendas.
Neste ano, parlamentares governistas e próximos à cúpula do Legislativo têm usado uma brecha nas regras do Congresso para destinar emendas às suas bases eleitorais sem revelar o padrinho político do recurso. Para isso, elas são registradas por um usuário externo, que pode ser qualquer pessoa.
Outro aliado do governo que conseguiu liberação de emendas foi Osmar Terra, com R$ 1,9 milhão para pavimentação de área rural em Santo Cristo (RS). O deputado tampouco respondeu à Folha.
Há cerca de um ano, uma comitiva do município foi a Brasília e, com ajuda de Terra, apresentou demandas ao governo, como pavimentação e compra de máquinas. A comitiva esteve ainda no Palácio do Planalto.
“As emendas de relator, ainda mais às vésperas da eleição, mostraram-se um abuso de poder econômico por parte do governo Bolsonaro para irrigar a campanha de seus aliados”, diz o deputado federal e ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha (PT-SP), que tem atuado na campanha do ex-presidente Lula (PT).
Em discursos recentes, Lula tem indicado que pretende trabalhar para alterar o modelo atual das emendas de relator. Neste ano, o dispositivo soma R$ 16,5 bilhões. Até hoje, foram negociados com deputados e senadores cerca de R$ 11,8 bilhões, e R$ 8,7 bilhões dos quais foram liberados.
Fonte: Folha de São Paulo